As primeiras referências ao conceito de BIM surgiram nos EUA, Reino Unido e Europa em meados dos anos 1970, paralelamente ao desenvolvimento e disseminação dos sistemas CAD, apesar do termo “Building Modeling” ter sido utilizado somente a partir de meados da década seguinte. Alguns setores da indústria, como a aeroespacial, automotiva e mecânica, devido às suas características e necessidades próprias se ajustaram mais rapidamente à modelagem 3D, e posteriormente da informação, enquanto a indústria da construção, talvez por ter seus diversos agentes pulverizados e por conveniência, preferiu associar seu desenvolvimento tecnológico consagrando o sistema CAD, relutando em abandoná-lo até os dias atuais.
Diante do exposto, KENSEC, 2018, questiona: “Como o BIM é substancialmente diferente do projeto assistido por computador (CAD) e outros tipos de programas de modelagem 3D?”. Essa pergunta é de extrema relevância para quem de alguma forma está envolvido em um empreendimento, desde incorporadores, projetistas e construtores até o proprietário. Respondê-la passa pelo conhecimento das vantagens e desafios de cada um dos métodos e pelo entendimento que eles constituem maneiras distintas de pensar e desenvolver projetos e, portanto, influenciam o resultado final.
a) CAD (Computer Aided Design)
O CAD (desenho assistido por computador), cujos primeiros protótipos surgiram nos Anos 1950, passou por grande impulso a partir da década de 1980 com o desenvolvimento dos computadores pessoais e surgimento de vários desenvolvedores de softwares, dentre eles a Autodesk com o AutoCAD e a Bentley com o Microstaion, muito conhecidos no Brasil.
Sua aplicação, com uma simples mudança de mídia, revolucionou a indústria de projetos nos últimos 30 anos, ao transportar para o computador o processo de criação de desenhos técnicos para projeto, que anteriormente eram desenvolvidos em pranchetas. Ao se utilizar do conceito de camadas (layers), os softwares CAD conseguiram popularidade por se manter próximos à referência que se tinha na época para um setor acostumado a lidar com folhas físicas de desenho, já que sua abordagem tem como base a metáfora de que as camadas são folhas virtuais que compõem o arquivo CAD.
Em sua estrutura, os softwares CAD são compostos por objetos – linhas, círculos, textos, linhas contínuas, figuras geométricas, dentre outros, que são definidos por fórmulas e por serem baseados em imagens vetoriais, atendem ao foco principal de possuir excelente qualidade gráfica, independentemente da resolução de tela ou saída. Além da precisão, os desenhos desenvolvidos em CAD permitem flexibilidade de ajustes, produção de múltiplas cópias, capacidade de troca de informações entre diversos aplicativos e operadores (interoperabilidade), exigindo pouco espaço de armazenamento e mão de obra reduzida.
Por outro lado, ao passo que sua aplicação foi se intensificando, as relações de emprego sofreram impactos importantes, exigindo novas qualificações dos desenhistas, para não correrem o risco de exclusão do mercado de trabalho, bem como uma banalização do serviço, principalmente pela ideia equivocada de que mudanças podem ser realizadas a qualquer momento, sem critério ou custo envolvido.
No que diz respeito ao fluxo de trabalho, na lógica CAD os projetos, cuja documentação é compostas por folhas e pranchas contendo desenhos 2D e eventuais detalhes em perspectiva, são segregados, desenvolvidos por partes, por profissionais distintos e independentes entre si, o que pode gerar erros e conflitos entre os projetos, com elevada probabilidade de serem identificados somente durante a obra. Mesmo que reconhecidos durante a fase de projetos, a sua resolução pode implicar na alteração de várias folhas, com custos de retrabalho e revisões eventualmente incompletas e imprecisas, de forma manual.
b) Modelos 3D
Os modelos 3D tiveram suas primeiras aplicações no início dos anos 1970, incluindo filmes, projetos e, eventualmente, jogos, cujo propósito de visualização baseava-se na habilidade de representação de um conjunto de formas poliédricas. Seu foco está na abordagem geométrica de seus elementos, a partir da modelagem de sólidos.
Desde seu surgimento, diversas linhas de pesquisa em paralelo desenvolveram elementos para modelagem 3D, com destaque para os elementos de: arame (wireframe); superfície (surface); sólidos (solids) e NURBS, cada um com suas potencialidades. Dependendo do grau de evolução, seus elementos podem ser paramétricos, o que permite variações alterando determinados parâmetros, mas associados apenas a características geométricas.
No início dos anos 1980, a modelagem de edifícios baseada em modelos de sólidos 3D foi desenvolvida como evolução de sistemas CAD, baseada na abordagem geométrica, paralelamente ao desenvolvimento de modelos para projetos de produtos mecânicos, aeroespaciais, de construção e elétricos. Contudo, de acordo com EASTMAN, et al., 2014, sistemas CAD de modelagem de sólidos eram funcionalmente poderosos, mas em geral ultrapassavam o poder computacional disponível.
Naquela época, o custo para obtenção de softwares e hardwares que permitissem a aplicação dos modelos 3D era elevado, de modo que o setor da construção, não foi sensibilizado pelos benefícios propostos e, por estar satisfatoriamente bem adaptado em termos de custo e produtividade, se manteve fiel ao uso do sistema CAD 2D, com aplicações esporádicas de modelagem 3D em maquetes eletrônicas e estudos de volumetria, por exemplo.
Enquanto isso, outros setores como a indústria de manufaturas, aeroespacial, automobilística e mecânica se aproveitaram dos potenciais benefícios da modelagem 3D e buscaram junto aos desenvolvedores CAD soluções para as possíveis deficiências tecnológicas no contexto dos modelos 3D, alavancadas inclusive pela redução do custo dos recursos tecnológicos nas últimas décadas, o que permitiu o desenvolvimento do processo de automação desses setores.
Sendo assim, seria possível inferir, com muita cautela, que os modelos 3D representam um elo de aproximação entre o CAD e o BIM, pois podem fazer parte de ambas as abordagens, dependendo da riqueza de informações e grau de desenvolvimento dos seus elementos. Isso, contudo, pode levar à interpretação equivocada de que o BIM seria uma evolução do CAD, o que não corresponde à realidade.
c) Modelos BIM
Se por um lado o CAD pode ser considerado como um produto gerador de desenhos e, por isso sem maiores problemas, confundido com um software, por sua vez o BIM é um conceito mais amplo que envolve políticas, processos e tecnologia, de forma inter-relacionada, estabelecendo-se como um banco de dados digital 3D integrado e estruturado, constituído por objetos paramétricos, cujas informações (gráficas e não gráficas), relativas aos setores de arquitetura, engenharia, construção e operações, auxilia a obtenção e gerenciamento do máximo de detalhes referentes a um empreendimento.
A lógica BIM também expande o contexto de um modelo 3D, pois sua base de dados contempla outros aspectos importantes de modo que o modelo BIM é capaz de medir e quantificar seus elementos, que além de serem objetos paramétricos, possuem “inteligência comportamental”, pois obedecem a regras específicas de comportamento associadas a elementos ou processos construtivos. Por exemplo: uma porta precisa de uma parede, “seu elemento hospedeiro natural”, para poder ser introduzida no modelo. Além disso, qualquer alteração realizada em um objeto pode ser observada em todas as vistas, plantas e tabelas que o objeto aparecer, já que o modelo é automaticamente atualizado.
Adicionalmente, o modelo BIM tem abrangência sobre todas as disciplinas e processos envolvidos; pode ser acessado por toda equipe em um ambiente multiusuário que utiliza um fluxo de trabalho colaborativo, com desenvolvimento conjunto e coordenado; acompanha todo ciclo de vida da edificação, desde o programa de necessidades até a demolição ou renovação/reforma, passando pelas fases de projeto, execução e operação, e permite interoperabilidade.
Em relação à documentação, embora as ferramentas BIM atuais permitam a criação de folhas e pranchas, de modo que o mercado ainda solicite e as utilize em larga escala, principalmente no canteiro de obra, a tendência é que com o tempo o modelo BIM em si seja a única fonte onde todos os agentes encontrarão as informações, sem a necessidade de visualização impressa em papel, mas a partir de recursos tecnológicos modernos como tablets, óculos 3D e visualizadores de realidade aumentada, dentre outros.
Uma vez que a representação gráfica deixa de ter relevância, o foco do BIM está na modelagem do produto, no caso uma construção e seus elementos. Contudo, é possível também trabalhar com a associação do foco em relação ao processo, o que, de qualquer forma, não deixa de ter sentido, como demonstra as dimensões BIM (2D a 7D) e o desenvolvimento da modelagem espelhando o processo construtivo. Semanticamente, ambos os termos em inglês “Modelling” ou “Modeling” são usados nas publicações internacionais.
Consequentemente, em face da contínua implementação do BIM, está em curso uma nova alteração na relação de trabalho. Antigos postos começam a desaparecer, sendo substituídos por outros, cujas competências e habilidades estejam adaptadas à nova realidade tecnológica, em todos os níveis da cadeia produtiva. O próprio fluxo de trabalho colaborativo indica a direção de que “não se faz BIM sozinho”, refletindo inclusive na remuneração de todos os envolvidos.
Conclusão
Conforme visto, existem diferenças significativas entre o BIM e o CAD, seja 2D ou 3D, inclusive no que diz respeito a abordagem de projeto e à modelagem em si. Também não seria correto dizer que o BIM seja uma evolução do CAD, uma vez que são formas distintas de conceber o projeto e seu desenvolvimento. Enquanto o CAD prioriza aspectos de precisão gráfica, o BIM vai além e seu conceito integra diversas informações, tanto gráficas quanto não gráficas contidas em uma base de dados comum, auxiliando toda cadeia produtiva envolvida a ter o máximo de detalhes acerca de um empreendimento. Sendo assim, mudar de CAD para BIM consiste, principalmente, em uma mudança de paradigma.
Bibliografia
AMORIM, S.R.L. Gerenciamento e coordenação de projetos BIM: um guia de ferramentas e boas práticas para o sucesso de empreendimentos. Rio de Janeiro: Elsevier, 2018.
EASTMAN, C.; TEICHOLZ, P.; SACKS, R.; LISTON, K. Manual de BIM: Um guia de MODELAGEM da Informação da Construção para arquitetos, engenheiros, gerentes, construtores e incorporadores. Porto Alegre: Bookman, 2014.
KENSEC, K. Building Information Modeling: BIM: fundamentos e aplicações. Rio de Janeiro: Elsevier, 2018.
SUCCAR, B. Building Information Modelling Framework: A reserch and delivery foudation for industry stakeholders. Automation in Construction, [S.I.], n.18, p.357-375, 2009.
Eng. Me. André Luís L Velame Branco Projetista, Professor e Consultor de Cálculo Estrutural
Pela proposta de valor diferenciada oferecida pela ALL VELAME Projetos de Estruturas, existe um amplo leque de potenciais projetos locais e em outros estados e regiões.